segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Meus colegas de trabalho;


Monique, Aman, Prior e Marie Ann são alguns colegas queridos que passaram ou ainda permanecem  na minha vida durante estes  quase  três anos de trabalho na minha empresa aqui em Londres. Por ser uma empresa que  possue  como público alvo os imigrantes, a maioria dos funcionários são imigrantes também.

 Monique, uma queniana que cursou Economia no Kenia e veio fazer MBA aqui em Londres, tem  costumes refinados, e  é sensível  a  qualquer  frase que soe  levemente preconceituosa em relação a sua cor, o fato de ser africana ou imigrante,  e protesta  com muita  veêmencia  e bons argumentos. Ela adora relatar as belezas  naturais de seu país, e não gosta quando o Kenia é  retratado  sómente pela  sua pobreza. 

Aman é um  muçulmano francês  muito alegre e engraçado, mas  que no mês do Ramadã (jejum muçulmano, onde  eles só podem alimentar-se e beber líquidos  no  período   da noite) ele fica magro, abatido e calado. Neste ano porém  ele fez diferente, ele tirou três semanas de férias e foi para o Marrocos. No início achamos que  ele estava maluco pois  nesta época  do ano  no  Marrocos a temperatura média durante o  dia é  de 43 graus. Como permanecer sem beber líquidos  com este calor?
Mas ele  e seus amigos tinham  um plano. Como nesta época o comércio de Marrakech, uma cidade turística marroquina,  funciona durante toda a noite devido ao Ramadã, eles  dormiam  o dia todo com ar condicionado  ligado no hotel, e  desfrutavam as férias  durante toda a noite.

Prior é um polonês  que,  apesar de nunca ter cursado uma universidade, entende  do setor financeiro  do Reino Unido  como  poucos na minha empresa. Como muitos jovens de sua idade, ele  deixou seu país em busca de novas experiências, além do valor da moeda aqui ser muito superior ao do seu país. Mas no caso de Prior, houve um fator ainda mais definitivo para ele deixar sua terra natal, ele é homosexual e a Polônia é um país extremamente católico, com costumes  arcaicos, o que faz com que a vida de um homossexual  lá se torne muito difícil.

 Marie Ann é uma típica garota inglesa de classe média baixa.  Ela tem  29 anos , é solteira, possue uma filha de 12 anos,  e  é  completamente sustentada pelo estado, através de benefícios  sociais de transferência de renda. Marie Ann trabalhou   na minha empresa sómente  por alguns meses, então  ela engravidou  e  parou de trabalhar.

Marie Ann nunca  havia  trabalhado antes,  assim como sua mãe e  muitas inglesas  de mais de duas gerações. Estas mulheres sempre foram  sustentadas  completamente  pelos referidos beneficios de transferência de renda do estado. Estes beneficios sociais são   muito bons para o bem estar das  crianças que podem desfrutar da presença materna em casa em tempo integral.  Porém quando as crianças  já não precisam mais das mães  todo o tempo,  estas mulheres  sentem-se inúteis, sem preparo para o  mercado de trabalho, com baixa auto estima.  É muito comum  então elas engravidarem novamente.  Acho que foi o que aconteceu com  Marie Ann. É  lamentável  pois  são mulheres jovens,  que não  possuem  sonhos,  ou planos para o futuro.

 Enfim, são tantas histórias,  que  eu precisava de  muito mais de um texto para relatar  todas. 

Sei que não vou trabalhar nesta empresa  para o resto da vida, mas nunca vou esquecer  das pessoas que convivi como colegas, e que  atendi enquanto clientes; todas me fizeram entender mais sobre a vida e as pessoas, me abriram horizontes e me mostraram como pessoas com realidades tão diferentes podem conviver  em harmonia.

Ligia Kaysel


terça-feira, 7 de agosto de 2012

As menininhas do metrô:


                                          

Ontem, voltando para casa de metrô, deparei-me  com uma cena  inusitada.

Eu estava num vagão onde havia  uma criança inglesa  de aproximadamente cinco anos, quando entrou no nosso vagão duas mulheres muçulmanas vestidas totalmente de preto, somente com os olhos a vista, com duas crianças: um bebê e uma garotinha de também aproximadamente cinco anos.  A mulher  mais jovem  orientou  então a criança mais velha   a sentar-se  no único lugar disponível do vagão, que era ao lado da menina inglesa.

A garotinha inglesa quando vizualisou uma provável companheira  de brincadeiras,  começou a  tentar  uma conversa com a possível amiguinha.

A menininha muçulmana no início se assustou, olhou para as duas mulheres  cobertas por véus, desejando aprovação. As mulheres vestidas de negro, através de seus olhares, demonstraram indiferença ao olhar da garotinha, fazendo com que a  mesma começasse a sentir-se  mais a vontade, esboçando  no início um tímido sorriso.

Com o tempo as duas estavam se divertindo com os adesivos que a primeira tinha trazido  consigo, colando e descolando em todos os lugares  ao redor  das mesmas. A fisionomia dos presentes  no vagão, grande parte composto por turistas que voltavam  das  competições  olímpicas, era de encantamento.

Quando chegaram ao seus  destinos, as crianças  despediram-se abanando  suas  pequenas mãozinhas.

 Fiquei então pensando o quanto  estas menininhas tinham  a nos ensinar. A inglezinha, diferentemente de seu próprio povo que possui,  na maioria das vezes, muito preconceito contra os muçulmanos; enxergou  sómente  uma garotinha de sua idade  com quem pudesse brincar. A outra, no início, temerosa por perceber, apesar da pouca idade, a hostilidade que seus familiares  muçulmanos  sentem  em relação aos ocidentais, com o  tempo, foi  percebendo  na menina inglesa,  nada mais do que uma garotinha da sua idade que podia ser  sua companheira  nas brincadeiras.

Sentir o outro como um igual, não se importando qual é a raça, cor, religião ou posição social, é um sentimento mágico  para obtenção de um mundo menos desigual. A criança nasce  com esta sabedoria, mas os adultos a ensinam a esquecer.

Ligia Kaysel